19/03/2008

Inconfessáveis

Não há beleza no desejo inspirado pelas obviedades. Há pouco mérito em querer apenas pelas ousadias, pelas safadezas de que se é capaz.
Desejáveis, adoráveis, inconfessáveis, são a pele que se dobra, pesada de anos, na curva do pescoço.
As mãos pequenas.
As incontáveis manias e os hábitos meio sem sentido de homem solteiro.
Uma leve hipocondria, divertida.
A inflexão dada ao meu nome, ao telefone, como se ficasse surpreso por ser eu do outro lado da linha.
Uma timidez domada, um ciuminho feliz.
E os sussurros de "minha", que você não consegue repetir sob a luz acesa.
O visigodo em todos nós



Leblon. Aquele desfile de óculos escuros de grife que todo mundo já sabe. Apartamentos quilométricos de frente para o mar. Trés chic. E, de repente, lá vem ele - um altíssimo representante da cultura nacional, vestindo o impossível. O mais bizarro figurino envolvendo tronco e membros da criatura. Mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que imaginar aquele ser respeitado, letrado, incensado, elevado, vestindo o que vestia. Incompatível. Indescritível. Eu posso, você pode. Ele não.
Ou pode?
Mora um cafona em cada um de nós.
Na década de 70, Francisco Cuoco já foi o próprio, em uma grande novela da Globo (as novelas já foram grandes um dia, acredite). Empresário de sucesso, não fazia o menor esforço para esconder as preferências estéticas. O símbolo de seu império empresarial era uma réstia (para quem não é do tempo da réstia, a explicação: é aquela trança de cebolas que ficava pendurada nas quitandas. Se não sabe nem o que é quitanda, lamento). É este cafona que não se rende, que não se dobra, que insiste em aparecer pelas frestas. Nenhum compromisso com os sinais exteriores de antenação. Um bárbaro, um visigodo invadindo o império das fashion weeks e dos cadernos de cultura.
Diz aí que você não sabe o refrão de "Morango do Nordeste"? Que nunca interrompeu o zapping de madrugada para ver uma entrevista no Amaury Jr.? Ou que não guarda no armário uma peruca canecalon, uma blusa de gola rolê, uma calça baggy?
Ao fim e ao cabo destes mal empilhados parágrafos, pedra, mas também vidraça, deixo o bombástico registro: adoro o Louro José!
Vai lá: manda a primeira estilingada quem achar que pode.